Muitos líderes europeus têm enchido a boca a dizer que estão dispostos a fazer tudo o que seja necessário para defender o euro. A sério?
Uma das medidas mais obviamente necessárias para defender e preservar a médio prazo o euro é a criação de um verdadeiro orçamento federal, muitíssimo superior ao actual, que representa pouco mais de 1% do PIB comunitário. Pelo contrário, a intenção dos países contribuintes (Reino Unido, França, Alemanha, Holanda e Finlândia) é de o congelar até 2020!
Outra medida, menos estruturante, mas que dá mais tempo aos países para resolverem os seus problemas, com menos pressão orçamental, é a criação de obrigações europeias. “Pois, mas isso nem pensar!”.
Sugiro uma terceira medida, que não tenho ideia de ter sido proposta até agora: a criação de um Fundo Europeu de Garantia dos Depósitos.
Se um banco sedeado na Califórnia estiver em risco de falir, ninguém esperará que o Estado da Califórnia venha em seu socorro, o banco irá à falência e os depositantes desse banco serão compensados pelo fundo de garantia federal (Federal Deposit Insurance Corporation), criado em 1934.
Na zona do euro, houve inclusive pressão europeia para ser o Estado irlandês a salvar os bancos aí sedeados, colocando as suas contas públicas em tal risco que se viu forçado, de novo sob pressão dos seus pares, a recorrer ao Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e ao FMI.
A criação de um fundo europeu de garantia dos depósitos poderia trazer inúmeras vantagens, desde logo o de tornar o eventual salvamento de bancos um assunto europeu e não nacional, diluindo algum contágio entre o sector financeiro e a dívida soberana, um dos problemas detectados por Reinhart & Rogoff.
Este fundo europeu constituir-se-ia pela agregação dos fundos nacionais já existentes, com uma uniformização de regras e, mais importante, maior exigência. É evidente que as contribuições para o fundo deveriam ser função não só dos rácios de capital dos bancos, mas também da sua liquidez. Os investimentos financeiros de longo prazo, que se permite que não sejam avaliados pelas cotações de mercado, teriam que passar a ser avaliados considerando pelo menos parte das perdas potenciais. Não é possível continuar a fingir que activos com perdas sustentadas de 20% nas cotações possam continuar a ser avaliados como se estivesse tudo bem, ainda por cima quando representam uma percentagem significativa dos capitais próprios dos bancos.
É evidente que os testes de resistência dos bancos teriam que passar a ser muito mais exigentes e os próprios resultados destes testes deveriam influenciar as contribuições dos diferentes bancos para este fundo de garantia dos depósitos.
Na verdade, um fundo europeu de garantia de depósitos levaria a uma avaliação muito mais rigorosa dos riscos dos bancos, podendo servir para aumentar a transparência no sector e revitalizar o mercado monetário.
Simplificando um pouco, os países com mais problemas de dívida pública são os países com défices externos, enquanto os países com superavits externos, ou seja, com excesso de poupança, são os que mais compraram aquela dívida pública em risco, sobretudo através dos seus bancos.
Ou seja, a Alemanha e a França são dos países com mais problemas no sector bancário, o que os poderia aproximar da solução descrita acima. Esta parece ser mesmo uma das soluções sistémicas para a zona do euro a que a Alemanha menos se deve opor. A não ser que a ideia de sair do euro já esteja a ficar tão enraizada, que os alemães já não se queiram envolver em nada de que deverão sair em breve.
Esta medida teria três vantagens. Em primeiro lugar, afastaria mais o cenário de uma crise bancária se traduzir numa crise de dívida soberana, diminuindo a probabilidade do efeito dominó, que ameaça a zona do euro. Será importante referir que os dois países na linha da frente para cair estão com problemas bancários: os bancos portugueses estão sem acesso a liquidez no mercado desde Abril do ano passado e os bancos espanhóis estão com problemas de solvência, devido ao rebentamento da bolha imobiliária.
Em segundo lugar, seria um teste à determinação dos líderes europeus em tomar medidas importantes que possam servir mesmo para defender o euro.
Em terceiro lugar, num cenário de desmoronamento do euro (que eu considero o mais provável) permitiria transferir parte dos custos de reestruturação da dívida bancária para o nível europeu, aliviando quer os bancos, quer os países afectados.