Os países com moeda própria (e com livre circulação de capitais) são avaliados pela sua taxa de câmbio, enquanto dentro de uma união monetária são avaliados pelas taxas de juro (da dívida soberana e outras).
Este mecanismo de avaliação tem duas componentes, uma de potencial castigo e outra de potencial auxílio na correcção de problemas.
Um país com moeda própria e com problemas sérios nas contas externas pode ver a sua moeda atacada pelos especuladores. Este ataque tem um duplo efeito, castiga o país, cuja produção passa a valer menos, mas recebe uma forte ajuda para corrigir as suas contas externas. Depois da depreciação as exportações aumentam, o défice externo cai e o problema que desencadeou o ataque é resolvido.
O que se passou em Portugal quando pedimos ajuda ao FMI em 1978 e 1983 não foi exactamente o que foi descrito acima, porque não havia liberdade de circulação de capitais, mas o escudo foi desvalorizado e o problema do défice externo foi muito rapidamente sanado.
Como é agora com as taxas de juro no euro? Elas têm uma óbvia capacidade de castigar, mas uma enorme dificuldade em ajudar a corrigir problemas. A subida das taxas de juro poderia ajudar a corrigir problemas se tivesse ocorrido no início destes e não a meio. Se os mercados tivessem penalizado correctamente os países gastadores estes nunca poderiam ter ido tão longe no seu endividamento (público e privado).
É evidente que os mercados erraram no passado, mas não é legítimo criticá-los quando quem falhou em primeiro lugar foi quem tinha mais responsabilidades pela defesa do euro: os países membros e a Comissão Europeia. Vou apontar um único erro: como foi possível que os membros do euro tivessem permitido que a Grécia os enganasse nos números que apresentou para conseguir aderir e depois os voltasse a enganar descaradamente com o défice público de 2009? Aliás, quem critica os mercados considera-os incompetentes e nunca deveria ter esperado que fossem eles a resolver os problemas.
A subida das taxas de juro depois do problema se ter instalado só agrava o problema das contas públicas. Ela sinaliza o problema e cria um incentivo político para ajudar a resolver o problema, mas a sua evolução não ajuda a resolvê-lo.
Isto é radicalmente diferente do que se passa com a taxa de câmbio. A depreciação da taxa de câmbio não só sinaliza o problema como diminui o défice externo. A subida das taxas de juro sinaliza o problema, mas agrava o défice público.
E os efeitos são ainda piores no caso de países que, para além de terem um problema nas contas públicas, têm também um problema nas contas externas, como é o caso de Portugal e da Grécia, sendo o nosso caso mais grave na vertente externa.
Se antes da crise da dívida soberana Portugal tinha uma quase total incapacidade de atrair investimento estrangeiro para exportar (pelos problemas de competitividade), com a subida das taxas de juro passou a ser ainda menos atractivo para investir, inclusive para os investidores nacionais.
Esta questão parece-me ser um dos elementos centrais a considerar: com moeda própria a variável que sinaliza os problemas ajuda a resolvê-los; numa união monetária a variável que sinaliza os problemas agrava esses mesmos problemas.
2 comentários:
Pedro Braz Teixeira
Interessante o seu comentário e bem "esgalhado" quanto ao timing e na abordagem.
Quando "avançar" na elaboração do cenário que propõe, vai verificar que:
a) De um ponto de vista estrictamente económico; a verificação da "crise" do euro como a apresenta ainda vai demorar uns 4/5 anos. Trata-se do tempo necessário para se poder consolidar os balanços dos principais bancos europeus; naõ se preocupe com a nacionalidade que não tem muita importtância para o caso.
Quando estiverem consolidados, vamos assitir ao incumprimento soberano em "cadeia" e a uma versão remoçada dos Brady Bonds".
O contágio e a histeria que se assiste está ancorada no actual momento e vem demonstrar o nervosismo face a uma inepta condução mediática da crise.
b) O euro é um projecto político e não económico. Se fosse económico há muito que os ingleses estavam "dentro" do euro. Pode parecer lapalissiano mas, a maioria dos analistas esquecem-se que deste "pequeno" pormenor ou, como sucede em Portugal, interpretam do modo enviesado que lhes interessa.
Sendo um projecto político, o que se tem de começar a pensar é em definir quem manda e, dentro de quem manda, quem manda mais. O primeiro problema começa aqui: a Alemanha devia mandar mais mas, nem sabe se quer, nem tem plano claro para tal; já se percebeu que quer um conjunto de pequenas alemanhas, assim como a Prússia qquiz e exigiu aos outros que se transformassem em pequenas prússias; mas não se percebeu o que vai dar em troca: isto é, qual o rumo para a europa, contrapartida da liderança e da "honra" de partilhar o marco.
(Não tenha sequer a ideia que o facto de ser político vai significar que não vamos pagar; vamos e muito caro.)
c) Sendo um projecto político qual será o preço que, cada nacionalidade europeia está disposta a pagar para ter a Alemanha na liderança.
Qual é o nosso limiar da dor? 750.000 desempregados? 800.000?
Qual é o limiar da dor grego? 500.000 desempregados e cortar o exército para metade? Vender as ilhas? Qual será a capacidade dos governantes em "convencer" os seus cidadãos da valia e bondade do euro?
d) Alguns pontos que deve, permita-me a audácia, seguir: o que vai sair das "conversas" entre Sarkozy e a Merkel; quanto tempo vamos (Portugal) resistir antes de atirar a toalha e solicitar a entrada do fundo europeu; quanto tempo vai demorar para Espanha implementar mais medidas de austeridade e por quanto tempo vamos "ver" sair papeis "anónimos" sobre a credibilidade dos dados espanhóis?
Conclusão
A narrativa "anglo-saxónica" do desenrolar dos acontecimentos é interessante mas obnubila o essencial: antes da economia está a política e, no plano internacional, a política são os interesses das nações.....
No contexto europeu, os próximos cinco anos definirão o mundo para o resto do século e, ou muito me engano ou teremos uma francogermania alargada: aquilo que Carlos Magno nunca sonhou: um sacro império do Atlântico à linha Oder Niesse.
No nosso cantinho o que se irá colocar é a opção entre sermos "livres" ou um protectorado;
(Porque será que se impôs o "bail out" à Irlanda primeiro que a Portugal? não quer reflectir sobre este fenómeno?)
Cumprimentos
joão
O melhor artigo que li sobre o problema do euro e a moeda própria.
É muito importante começar a especular sobre formas de minimizar os danos causados ao emprego, sem sair do euro.
Penso que a primeira seria colocar o máximo de divida pública junto dos particulares com taxas altas e sinalizar o mercado que isso seria uma actuação sistemática.
outra seria a redução da taxa da s.social de 24% para 11% para todos os novos empregados.
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